TJMG terá Núcleo de Justiça restaurativa

Após estudos conduzidos pela 3ª Vice-Presidência, o programa de Justiça Restaurativa do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) foi concluído. A aplicação da metodologia é uma exigência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para todas as cortes do País.

A justiça restaurativa procura conscientizar as pessoas sobre os fatores motivadores de violência e suas consequências, buscando a satisfação das necessidades dos envolvidos e a responsabilização ativa de quem causou o dano. A ideia é empoderar a comunidade por meio da reparação do prejuízo e da recomposição das relações sociais rompidas pelo conflito.

Experiências bem-sucedidas no Judiciário estadual mineiro se restringiam ao Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional de Belo Horizonte (CIA-BH) e ao Juizado Especial Criminal na capital. Houve ainda oficinas oferecidas em Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs).

A metodologia também foi objeto de Termo de Cooperação Técnica firmado em 2018. O programa Nós, voltado para escolas públicas municipais e estaduais da capital inclui o Judiciário, o Governo do Estado, o Município de Belo Horizonte, o Ministério Público de Minas Gerais e a Universidade Federal de Minas Gerais.

Mas a formalização do programa vai permitir sua difusão e expansão, o mapeamento e a articulação de atividades, a aplicação e a sistematização de práticas, além de novas parcerias. As ações serão coordenadas e acompanhadas pela 3ª Vice-Presidência do TJMG.

Impulso nacional

De acordo com o 3º vice-presidente, desembargador Newton Teixeira Carvalho, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vem fomentando a justiça restaurativa nos tribunais brasileiros, e essa escolha, foi abraçada pelo TJMG. Mesmo porque projetos do Judiciário mineiro com a metodologia já existiam desde meados de 2011.

“Em 2019, o Conselho incluiu a justiça restaurativa na Resolução 225/2016 , que trata da política nacional para resolução pacífica de conflitos de interesse. Mas, já em 2015, o CNJ havia aprovado, como meta nacional para o ano seguinte, que as cortes de justiça estaduais passassem a oferecer práticas restaurativas”, enumera.

Em agosto de 2019, o CNJ instituiu um Comitê Gestor da Justiça Restaurativa com participação de magistrados de várias regiões do País, da justiça federal e estadual. A Resolução 300/2019 incumbiu o Comitê Gestor de prestar consultoria aos tribunais e acompanhar a implantação das ações envolvendo a justiça restaurativa.

A coordenadora do programa de justiça restaurativa do TJMG, desembargadora Hilda Teixeira da Costa, lembra que a 3ª Vice-Presidência já havia adotado o modelo a partir de 2010, na gestão da desembargadora Márcia Milanez. À época, começou o projeto-piloto e houve cursos para servidores do TJMG.

“O desembargador Newton Teixeira, na condição de 3º vice-presidente, está estimulando muito essa área porque ela traz essa possibilidade de reconstruir relacionamentos e atenuar o prejuízo pelo fato que ocorreu. O agente é visto não apenas como o autor de um dano, mas um ser humano que merece reconhecimento. Isso pode, por exemplo, facilitar a ressocialização do preso e de egressos do sistema prisional. São várias as searas de atuação e, por isso, essas formas mais adequadas de solução de conflitos estão crescendo”, afirmou.

O desembargador Newton Teixeira, 3º vice-presidente, enfatiza que o TJMG está empenhado em difundir a justiça restaurativa

Inovação pacificadora

O desembargador Newton Teixeira Carvalho, que é coordenador do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), enfatiza que o objetivo de todos os métodos autocompositivos é encontrar as melhores soluções para as partes envolvidas e a comunidade, numa análise caso a caso.

“Na justiça restaurativa, vítima e infrator participam coletiva e ativamente na resolução dos traumas e perdas causados pela conduta do ofensor. Se preciso, outras pessoas podem ser contempladas. As linhas de atuação são amplas, podendo abranger a prática de atos infracionais, episódios de violência doméstica e familiar e desentendimentos no ambiente escolar”, afirma o magistrado.

A coordenadora do programa de justiça restaurativa do TJMG, desembargadora Hilda Teixeira da Costa, destaca que não se trata de ajuda terapêutica nem psicológica. A pretensão da justiça restaurativa é melhorar os relacionamentos afetados, porque a pessoa que se desviou vai voltar à comunidade de onde saiu e o comportamento dela tem impacto no entorno.

“Se esse indivíduo retorna simplesmente tendo cumprido uma pena privativa de direitos ou uma medida socioeducativa, ele não verá os efeitos que o seu comportamento originou para a comunidade nem para a sua própria família”, explica.

A magistrada afirma que a justiça restaurativa coloca todos os envolvidos, direta e indiretamente, para conversar sobre o que houve, sentimentos e necessidades, e para formular um pedido de reparação. Essa solicitação pode ser aceita ou não. O acordo é elaborado conjuntamente, com a manifestação de todos os envolvidos.

Inovação nas relações

O desembargador Newton Teixeira Carvalho disse que a justiça restaurativa é uma alternativa às decisões tradicionalmente impostas. “É um procedimento de consenso. As partes podem usá-lo de forma alternativa ou concorrente com o processo, até mesmo antes de existir uma demanda judicial”, esclarece.

A reparação dos danos ocorre por meio do diálogo e do compartilhamento de responsabilidades entre os envolvidos no caso, consideradas as necessidades legítimas de todos e a complexidade do fenômeno da violência.

Segundo o 3º vice-presidente, o modelo não busca meramente aproximar vítima e ofensor, mas proporcionar à pessoa prejudicada um papel de protagonismo durante o processo e a escuta ativa do ofensor. “Com isso, garante-se não só a aplicação da lei ao caso concreto, mas uma maior sensação de justiça e reparação de danos às partes”, diz.

A proposta é restabelecer relacionamentos prejudicados pela violência em famílias, entre vizinhos, no ambiente escolar e de trabalho. Como os demais modelos de autocomposição, a justiça restaurativa valoriza a participação ativa e autônoma dos envolvidos. A participação no procedimento deve ser voluntária.

“Ao conversar com o acompanhamento de profissionais capacitados, as pessoas entendem a causa da controvérsia, reconhecem seus sentimentos, condutas e responsabilidades, buscando restaurar laços sociais, compensar eventuais danos e comprometer-se com a harmonia”, diz.

Pluralidade

A desembargadora Hilda Teixeira da Costa ressaltou que se trata de uma forma nova de justiça. Entre os estudiosos, sequer existe um conceito fechado do que seja a justiça restaurativa, que é um conjunto de propostas bastante diversificadas.

A desembargadora Hilda Teixeira da Costa é a coordenadora do programa de justiça restaurativa do TJMG

“O que se sabe é que é preciso que a vítima participe do processo criminal, porque ele não diz respeito apenas ao Estado, mas sobretudo àquela que é a primeira atingida pelo fato danoso. A vítima precisa ser ouvida quanto ao que sente, ao que necessita e o modo como deseja ser reparada pelo que aconteceu”, defende.

A expressão “justiça restaurativa” tem como premissa a escuta mútua empática, em que cada um apresenta sua versão dos fatos e o seu contexto. “É muito importante existir esse momento de ouvir a história, mas a dinâmica é diferenciada em cada modelo de técnica restaurativa”, avalia.

De acordo com a coordenadora do programa, uma das ferramentas utilizadas, ainda que de forma implícita, é a comunicação não violenta, conceito elaborado por Marshall Rosenberg. “Trata-se de uma maneira de falar e expor suas razões sem ofender as pessoas, buscando criar o entendimento. Esse instrumental está presente em muitas formações para a justiça restaurativa”, pontua.

Funcionamento e estrutura

A 3ª Vice-Presidência acompanha a adoção dos métodos autocompositivos, por meio do Nupemec, e as iniciativas inovadoras no Judiciário estadual mineiro, por meio da Assessoria de Gestão da Inovação (Agin).

É o caso do programa de justiça restaurativa do TJMG, que contará com duas bases de sustentação: o Núcleo de Justiça Restaurativa (Nujur) e o Centro de Apoio à Justiça Restaurativa (Ceajur).

O Nujur vai gerenciar e coordenar as propostas, sob a supervisão do Nupemec e com o auxílio da Agin. Já o Ceajur tem a atribuição de conduzir e executar as iniciativas em justiça restaurativa da comarca de Belo Horizonte, além de prestar apoio administrativo aos projetos no âmbito do TJMG.

Outra tarefa do Ceajur é a interlocução com o interior, especialmente para uniformizar as práticas restaurativas que já vêm sendo aplicadas nas comarcas e orientá-las no desenvolvimento de projetos para a implantação, difusão e expansão dessas ações.

Os facilitadores dos círculos restaurativos deverão submeter-se a cursos de capacitação específicos promovidos pelo Tribunal ou em parceria com entidades privadas, desde que autorizadas pelo Nupemec.

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rdportari

Jornalista, professor universitário, Dr. em Comunicação

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