Google, Facebook e operadoras ajudam governo a monitorar Isolamento Social e riscos de contaminação

Talvez você não tenha reparado que o celular que carrega o tempo todo na mão, no bolso ou na bolsa tem embutido um GPS (Sistema Global de Posicionamento, da sigla em inglês), que serve para te ajudar a saber onde está num mapa, qual caminho tomar quando está perdido, se deve virar à esquerda ou quanto falta para chegar a um destino, onde está o seu celular perdido/roubado ou qual o nome do estabelecimento onde está para colocar na descrição de uma foto no Instagram.

O uso da chamada tecnologia de geolocalização, que permite a troca constante de informações entre seu aparelho e um satélite, costuma passar batido no nosso dia a dia. Mas agora aparece um outro lado —muito assustador e também muito útil.

Sim, empresas como a Google, dona de aplicativos como o Google Maps, o Waze e o Google Fotos, e o Facebook, dono de WhatsApp e Instagram, armazenam seus deslocamentos. Além de abastecer um histórico dos seus trajetos ou locais visitados, esses dados agora serão usados para criar índices (nacionais e por estado) do comprometimento com o isolamento social, medida defendida pelas autoridades sanitária para evitar a rápida propagação de covid-19.

O Google disponibilizou na sexta-feira (3) o “Relatório de Mobilidade da Comunidade” em 130 países, inclusive no Brasil, com dados agregados e anônimos de usuários que ativaram a configuração “Histórico de Localização”. As informações mostram alterações nas visitas de lugares como supermercados e parques.

As operadoras de telefonia Algar, Claro, Oi, Tim e Vivo fornecerão a localização de 222,2 milhões de linhas móveis para o Ministério da Ciência, Inovação, Tecnologia e Comunicação (MCTIC) —as cinco empresas respondem por 97,8% dos 227,1 milhões de acessos móveis no Brasil.

O Facebook, que detém informações de mais de 2 bilhões de pessoas ao redor do mundo, sendo 130 milhões no Brasil, soltou três mapas com a movimentação dos brasileiros durante a pandemia:

Já a startup brasileira In Loco, especializada em fornecer inteligência a partir de dados de localização, puxou dados públicos das operadoras, usados na publicidade, para analisar o comportamento de 60 milhões de celulares brasileiros (a população estimada do Brasil hoje é de 211 milhões, segundo o IBGE). Ela usa uma tecnologia que interpreta as geolocalizações para dizer quantas pessoas estão “estacionadas”, ou seja, em casa.

Isso virou o IIS (Índice de Isolamento Social), que você pode analisar nos gráficos abaixo. Ele é medido diariamente, de forma automatizada (bot), para estabelecer a razão entre quem fica em casa e quem se desloca.

Normalmente, você precisa ativar a função de geolocalização — alguns pedem autorização para enviar os dados. Mas, quando isso acontece, eles se tornam públicos.

O Advertising ID ou código de publicidade é um número único que constantemente identifica os interesses dos usuários que navegam pelos serviços de plataformas como Google e Facebook. Ele serve para mostrar anúncios segmentados ou personalizados (ou “anúncios com base em interesses”), que geram receita para os apps, mas também podem ser usados para rastrear deslocamentos e uso de apps.

Adesão fica na casa de 55%

A principal informação que podemos tirar desse levantamento é que o ápice da adesão ao isolamento social foi em 26 de março, quando chegou a 57,6% dos usuários de celular —quando tiramos dessa conta os finais de semana. Desde então, o índice fica abaixo de 54%, marcando picos de pessoas em casa somente aos domingos.

A média do IIS nos últimos 13 dias foi de 55,2% —do dia 24 de março, primeiro dia de quarentena em São Paulo, principal foco dos casos, ao 5 de abril (última medida disponível). Excluindo os domingos, a adesão foi de 53,7%.

Antes dos decretos estaduais e municipais, que começaram a acontecer mais drasticamente a partir de 15 e 16 de março, esse IIS nos dias úteis ficava na casa dos 20%.

Comparando, temos:

  • 22 de março: 1º domingo com indicação de isolamento, índice vai a 69,6%
  • 5 de abril: domingo mais recente, índice caiu para 62,3%
  • Mais 4,4 milhões de pessoas nas ruas no intervalo de duas semanas

Impacto das falas do presidente

Claro que outros fatores interferem no quadro, mas as informações mostram certo impacto dos discursos do presidente Jair Bolsonaro em relação ao isolamento social —que ele contesta, contrariando o próprio Ministério da Saúde, por considerar excessivo.

> No dia 15, enquanto muitas pessoas já se movimentavam para aderir à quarentena, com várias escolas fechando, Bolsonaro foi para a frente do Palácio do Alvorada interagir com manifestantes pró-governo. O índice cai de 51,3% no domingo, quando normalmente há mais gente em casa, para 38,5% na segunda-feira e 29,9% na terça.

> No dia 17, a primeira morte no Brasil foi anunciada, o que fez o índice voltar a subir (de 29,9% a 38,2% nos dias seguintes);

> No dia 22, um domingo, o isolamento atingiu o pico de 69,6%. Desde então, o isolamento passou a oscilar dentro da faixa dos 50%.

> No dia 24, São Paulo decretou quarentena. No fim do dia, Bolsonaro disse, em pronunciamento na TV, que a covid-19 é uma “gripezinha” que não o afetaria por seu “histórico de atleta”. Disse ainda que ela não teria força no clima quente do Brasil e deveria ser resolvida com isolamento vertical (só idosos e grupos de risco em casa). O índice cai até chegar em 47,2% no dia 1º de abril, com recuperação apenas nos finais de semana (domingo, 29, e sábado, 4). (Veja o que diz a ciência sobre seis pontos do discurso)

> Nos dias 25 e 26, houve muita repercussão à fala do presidente, mas a adesão permaneceu até atingir o ápice de 57,5% na quinta. Desde então, a adesão caiu para outro patamar.

> No dia 30, segunda-feira, a semana já começa com índice de 52%.

> No dia 1º de abril, o IIS atinge seu menor índice desde que a quarentena foi decretada em SP e Bolsonaro fez pronunciamento.

Fonte: https://www.uol.com.br/tilt/reportagens-especiais/indice-de-isolamento-o-que-revelam-os-dados-de-celular-sobre-a-quarentena/index.htm#tematico-5

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rdportari

Jornalista, professor universitário, Dr. em Comunicação

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