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Opinião do leitor: Em Defesa do ISPA

Enganam-se ou age com absoluta má fé aqueles que nos últimos dias produzem o discurso que nunca ninguém ou nenhum setor da população frutalense tenha se manifestado em função das atuais condições de abandono e do franco processo de degradação pela qual o prédio do ISPA passa.

Inclusive mesmo que essa condição fosse real o atual movimento que está em curso no sentindo de recuperação das condições físicas do imóvel o que culmina com a preservação arquitetônica desse patrimônio, bem como a preservação da história e memória da cidade de Frutal não perde em momento algum a sua legitimidade.

Fato é que as manifestações e posições em defesa desse patrimônio, desse pedacinho de Frutal se davam de modo fragmentado junto a grupos específicos e que passam a se unir em bloco na medida em que a demolição do edifício se torna possibilidade eminente. Muitas são as ideias e possibilidades de projetos não só de recuperação, mas de dar uso adequado ao prédio do ISPA. Essa discussão sempre ocorreu.

Ionei Dutra e seus pares próximos são realidade concreta dessas discussões, bem como é concreto um projeto de uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público ou OSCIP local, a OIKAl, que dois anos atrás apresentou projeto junto ao governo federal para transformar aquele ambiente em uma incubadora de projetos voltados a área educacional e cultural. Mais concreto ainda é a própria ação do Ministério Público que cumpre seu papel ao defender que esse espaço cumpra de fato a sua função social, conforme reza o Estatuto da Cidade.

Posso eu mesmo me incluir nessas discussões na media em que na disciplina de Geografia Urbana ministrada por mim na Universidade do Estado de Minas Gerais discuto a questão do ISPA tomando como exemplo o fato de que seu abandono expressa em certa medida as contradições que marcam o espaço-mercadoria da cidade. Recordo-me inclusive que durante a campanha para prefeito de Frutal ano passado o então candidato Toinho Heitor possuía um projeto no sentindo de resgatar esse ambiente hoje consumido pelo tempo e lhe dar uso cultural e educacional.

O que está em jogo inclusive ultrapassa os conceitos de preservação patrimonial, isto é, defender a manutenção do ISPA é defender que a lógica do valor de troca não se imponha sobra o valor de uso. A cidade e essa condição não é uma particularidade de Frutal, cada vez mais tem sua realidade, sua dimensão espacial mercantilizada e acaba por gerar sérios impactos em nossas vidas, ou seja, a forma como nos relacionamos com a cidade em seus mais diversos aspectos passa também a ser norteado pelas relações de mercado.

Temos ali os proprietários do terreno que abriga o ISPA e que ao querer colocá-lo disponível no mercado de terras tencionam juntamente com outros agentes que atuam nesse setor – no caso os promotores imobiliários, bancos, construtoras e o próprio Estado representado pela prefeitura através um empreendimento imobiliário, isto é, a construção de torres de edifícios, revalorizar essa área e potencializar no presente e futuro a captura de renda, juros e lucros.

O movimento em defesa da manutenção do ISPA escancara legitimamente um conflito que outrora é vivenciado em outras cidades brasileiras, isto é, o grito contra a mercantilização pela da cidade, um grito contra a especulação imobiliária, um grito a favor da criação e manutenção de espaços de uso coletivo, que possam agregar elementos nas vidas dos indivíduos como lazer, conhecimento, informação e felicidade. 
Manter e restaurar o prédio do ISPA vai além do plano simbólico em manter viva e acesa a historia de produção da cidade de Frutal, significa transformar essa área em um formidável suporte de valore de uso destinado à coletividade.

Quem vai pagar pela reforma e produção desse possível espaço coletivo? Inúmeros são os meios e possibilidades, sejam elas oriundas da esfera estadual e federal, sejam elas em parcerias feitas com a iniciativa privada. Mas isso demanda de discussões, da elaboração de projetos sérios e competentes.

Quando leio e escuto os argumentos favoráveis, duvidosos e burros em relação à demolição do ISPA tendo a compreender que de fato a criticidade, o que somos e o que queremos como cidade passa longe, muito longe daquilo que venho procurando defender em Frutal, ou seja, o desenvolvimento em detrimento do crescimento. O desenvolvimento nos emancipa como sujeitos e cidadãos, o crescimento nos torna refém de uma lógica perversa, desse modelo modernizador urbano incompleto que paira em Frutal.
O movimento em defesa do ISPA não só possuí espaço, como é legítimo, tal como outros movimentos que ocorrem na cidade, sejam eles que de ordem for.

Defender que se constituía uma memória imaterial através de fotos, imagens e depoimentos da história do ISPA só tem pertinência e riqueza na medida em que esse ambiente seja resgatado, devolvido materialmente em reais condições de uso à comunidade frutalense, ou viveremos de imaterialidades pelo resto de nossas vidas?

Por Andre Vinícius Martinez

Docente do curso de Geografia da UEMG

Doutorando em Dinâmicas Espaciais e Territoriais Urbanas e Ambientais pela UNICAMP

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rdportari

Jornalista, professor universitário, Dr. em Comunicação

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