Etc&Tal – 21/03/99

Se na semana passada vibrávamos, nesta coluna, pelo grande número de boas notícias estampadas na edição de nº 444 do PONTAL, temos, desta vez, motivos de sobra para lamentar a ironia das peças que o destino nos prega. Esta é uma coluna triste e revoltada.

Triste porque, assim que fechamos a edição da semana passada, recebemos, através de um telefonema do amigo Kana, a notícia da morte de um dos eternos membros de nossa equipe: o Conrado Ferreira Campos, depois de um longo período de sofrimento resignado e silencioso, descansou. Passou para o andar de cima, porque uma pessoa com a competência e a serenidade de um Conrado tinha, mesmo, que ser requisitada por Deus, porque nestes tempos de crise e turbulência, quero crer que até mesmo o Paraíso tem sido afetado e, por isso, convoca nossas melhores cabeças para prestar serviço ao Senhor.

Lembro do Conrado, certa segunda-feira, chegando ao jornal com um exemplar da Folha de S. Paulo nas mãos. O jornalão paulista acabara de instituir a figura do “ombudsman”, uma espécie de defensor dos interesses do leitor nas próprias páginas do jornal.

— Precisamos ser o primeiro jornal do interior a ter um ombudsman — sentenciou nosso conselheiro e amigo. Olhei para os outros membros da equipe e, num instante, quase que em côro, numa só voz, respondemos:

— E ele será você.

Apanhado de surpresa, Conrado não teve como recusar. Durante dois anos exerceu a espinhosa missão de brigar conosco, principalmente numa época em que o jornal vivia engajado no projeto político de administradores que já passaram pela Prefeitura e defendia esse projeto abertamente. Conrado transformou-se no porta-voz dos excluídos, daqueles que discordavam e acreditavam não ter espaço no jornal.

Muitas vezes brandiu seus artigos em cima da minha mesa, como que para me intimidar e impedir de cortar suas idéias. É claro que eu nunca faria isso. O Conrado sabia exprimir muitas idéias em poucas linhas. Era direto, objetivo e sério. Em silêncio, sabia fazer barulho. Morreu em silêncio, recolhido à intimidade de sua casa, ao lado da esposa Giselda, sem incomodar ninguém. Morreu sem fazer barulho, mas, com certeza, fará uma falta danada e nós, seus amigos dos tempos da Chap-Car, do Conselho Comunitário, do GAC e de outros movimentos, já temos saudades de seu jeito irônico, bem humorado e inteligente de discordar das idéias que fossem contra os interesses de nossa comunidade.

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rdportari

Jornalista, professor universitário, Dr. em Comunicação

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