A infidelidade dos políticos- Frank Farley – Los Angeles Times

Reproduzo artigo publicado ontem no L.A Times e republicado pelo jornal O Estado de São Paulo. Alunos e curiosos em entender o emocional dos políticos devem lê-lo. Curiosos também. O texto é de Frank Farley, psicólogo e professor nos EUA.

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Na semana passada, Arnold Schwarzenegger se juntou ao clube dos conhecidos políticos que ganham os holofotes por terem traído suas mulheres. Outros membros incluem os presidentes John F. Kennedy, Bill Clinton e Franklin Roosevelt, membros ou ex-membros do Congresso, entre eles John Edwards, Newt Gingrich e John Ensign, e governadores, como Eliot Spitzer e Mark Sanford. Assim sendo, por que ainda elegemos pessoas assim? E por que, em tantos casos, continuamos a enxergar os mulherengos como heróis? Para começar, algumas das características que tornam uma pessoa habilidosa na política – traços que o público tende a admirar – são também responsáveis por predispô-la à infidelidade. Gingrich, que teve antes do fim do segundo casamento um caso com aquela que se tornaria sua terceira mulher, explicou recentemente sua conduta com as seguintes palavras: “Não há dúvida que, em certos momentos de minha vida, parcialmente impelido pelos sentimentos intensos que nutro pelo país, eu trabalhei com excessivo afinco e certas coisas inapropriadas ocorreram em minha vida.” Sua declaração é um insulto a milhões de americanos trabalhadores e monogâmicos. No entanto, se a intensidade dos sentimentos em relação ao país e a disposição para o trabalho não consistem em fatores que favorecem a infidelidade, quais seriam então esses fatores? São muitas as hipóteses possíveis: a necessidade de expressar poder, o amor pela conquista, talvez o narcisismo – características que podem beneficiar um político em outras arenas. Na minha opinião, o principal fator responsável pela infidelidade entre os governantes é uma predisposição a assumir riscos, que é também uma qualidade essencial para os políticos. O rótulo que aplico a casos desse tipo é o de “Personalidade tipo E” – o “E” correspondendo a “emoção”. Ter uma personalidade tipo E não é necessariamente um problema: muitos dos maiores sucessos e feitos americanos não teriam sido possíveis se não fosse por aqueles dispostos a correr riscos. Os EUA foram fundados por homens do tipo E que não tiveram medo de se levantar contra um dos maiores impérios do mundo. Acredito que, até certo ponto, os EUA podem ser descritos como um país do tipo E, inclinado a correr certos riscos. Os indivíduos de tipo E, porém, podem também apresentar uma predisposição a assumir riscos negativos, envolvendo-se no crime, no uso de drogas ou em encontros sexuais com desfechos ruins. Aqueles dispostos a correr riscos buscam levar vidas emocionantes, interessantes e desafiadoras. Tendem a acreditar que controlam o próprio destino. Costumam ser atraídos pela variedade, novidade, intensidade e incerteza. São muitas vezes criativos, manifestam opiniões independentes e, normalmente, apresentam um forte impulso sexual e energia de sobra. Na política, não costumamos votar nos candidatos mais discretos. Gostamos de carisma, ousadia e ideias novas expostas enfaticamente. Isto é parte do motivo pelo qual os políticos do tipo E frequentemente saem vencedores. No entanto, uma vez eleitos para seus cargos, eles podem também manifestar uma tendência menos desejável de envolver-se em riscos. Trata-se de algo que faz parte de suas personalidades. Por que os mais dispostos a correr riscos se veem atraídos por papéis de liderança na política? Basta analisar o cargo: tudo é imprevisível. Um candidato pode investir todas as suas energias e recursos em uma campanha e, ainda assim, sair derrotado. Não há garantias, nada de jornada fixa de trabalho e as viagens são constantes. Um político deve estar sempre de prontidão, apresentar desenvoltura ao conversar com uma sequência desconhecidos e ainda ser extrovertido ao falar em público. Não existe manual ensinando o caminho para o sucesso. Um político leva também uma vida de transparência, gozando de pouca privacidade. Todos os dias são tomadas decisões com o potencial de alavancar ou afundar uma carreira. Manter um lar, uma família e um casamento nos limites da normalidade é praticamente impossível. Quem poderia não apenas aceitar, mas prosperar em tais circunstâncias? Aqueles predispostos a correr riscos. Outro fator em casos de infidelidade dos políticos é o fato de eles se verem constantemente cercados por acólitos – seguidores, adoradores, membros da equipe de assessores, funcionários da campanha -, todos concentrados em agradar o político. Essa adoração pode contrastar muito com, digamos, uma mulher em casa reclamando por ser a única a levar o lixo para fora, passear com o cachorro e levar as crianças ao treino de futebol. Até o momento, os escândalos sexuais na política envolveram principalmente homens, em parte porque eles ainda constituem a maioria dos representantes eleitos. No entanto, conforme aumenta a proporção de mulheres envolvidas na política, é provável que a grande diferença entre os gêneros na frequência de casos de infidelidade diminua. Afinal, as mulheres da política também apresentam a tendência a correr riscos. Algo que me parece particularmente interessante é o quanto os americanos estão dispostos a perdoar o comportamento infiel dos tipos E com o passar do tempo, desde que não haja crime nem coerção envolvidos e desde que a traição não tenha sido particularmente cruel – quando há, por exemplo, um cônjuge muito doente envolvido no caso. Em geral, os americanos não permitem que a má conduta sexual manche a opinião que fazemos do legado político de um governante. No entanto, apesar da tendência de perdoar políticos infiéis, eles raramente voltam a se candidatar depois de terem a vida íntima exposta ao público. Isto significa que temos poucos dados para avaliar se a disposição da população ao perdão se estende às urnas. Antes de podermos traçar conclusões válidas quanto à disposição do eleitorado de perdoar esse tipo de má conduta, nós, que estudamos esse tipo de fenômeno, precisamos de mais exemplos de mulherengos conhecidos que voltem a se candidatar. Tenho a impressão de que esses exemplos ainda surgirão. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL É PSICÓLOGO E PROFESSOR .

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rdportari

Jornalista, professor universitário, Dr. em Comunicação

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