Entenda detalhadamente o julgamento que pode deixar Ciça na “ficha suja”

2402cicaA ex-prefeita Ciça deve enfrentar, amanhã, um dos piores desafios de sua carreira: está marcado para a quinta-feira o julgamento em segunda instância do processo movido contra ela por conta de fraudes no Concurso Público realizado em sua primeira gestão em Frutal. À época, denúncias feitas ao Ministério Público apontavam fraudes no certame, com candidatos que tiveram acesso ao gabarito das respostas antes da prova, uso de telefones celulares durante a aplicação dos exames, entre outras irregularidades que foram consideradas fraudulentas em todas as instâncias do judiciário: de Frutal a Brasília.

Passados 10 anos do concurso e seguindo a sua consequente anulação total (que obrigou a Prefeitura de Frutal a fazer um novo concurso e a pagar R$4 milhões em rescisões trabalhistas), o Ministério Público resolveu denunciar Ciça por improbidade administrativa, ou seja, por má-administração pública. Em Frutal, o juiz da Comarca local condenou a ex-prefeita pelos atos de improbidade, suspendendo seus direitos políticos por 6 anos, além de deixar caracterizado em sua sentença que teria havido dolo (dano intencional) ao dinheiro público devido a forma como foi feita a contratação da empresa Unicon para aplicação das provas: por dispensa de licitação que tramitou todas suas etapas em um único dia para validar um acordo verbal previamente feito entre a prefeita e os diretores da empresa, de Uberaba. Além disso, Ciça foi condenada a pagar em multa pelo caso.

Trechos da sentença condenatória

À época, a sentença do juiz em Frutal foi implacável: “Evidente, pois, a ré Maria Cecília Marchi Borges praticou ato de improbidade administrativa no que tange à contratação da Cooperativa de Serviços Profissionais Autônomos Unicon para realização do concurso público em análise, devendo ser condenada às iras do art. 12, inciso II, da Lei nº 8.429/92. Nos termos do art. 3º da Lei nº 8.429/92, conclui-se que também a Cooperativa de Serviços Profissionais Autônomos Unicon merece ser condenada na forma do dispositivo legal mencionado no parágrafo anterior. Isso porque concorreu diretamente para a prática do ato de improbidade por parte de Maria Cecília Marchi Borges, tendo participado do conluio fraudulento que culminou na anulação do concurso público. Além disso, a cooperativa foi diretamente beneficiada pelo recebimento das taxas de inscrições pagas pelos candidatos inscritos no concurso público. A condenação de Maria Cecília Marchi Borges e da Cooperativa de Serviços Profissionais Autônomos Unicon pela prática de atos de improbidade administrativa é, pois, medida que se impõe”.

Para justificar a suspensão dos direitos políticos, o juiz foi mais contundente em sua sentença: “A pena merece ser aplicada justamente para coibir qualquer outra tentativa futura de conluio fraudulento para lesar o erário, uma vez que estando com os direitos políticos suspensos, não poderão colocar seus nomes à disposição dos cidadãos para exercício de mandatos. Ademais é razoável a aplicação dessa penalidade, justamente porque seriam as requeridas pessoas ativas no cenário político desse cidade, e permitir que elas continuem a ter a capacidade eleitora passiva, mesmo diante dos atos de improbidade praticado seria um grande contrassenso, pois com novos mandatos políticos poderiam repetir atos improbos”.

Com essa condenação, Ciça já estaria inelegível. Porém, como é normal em todo processo, seus advogados recorreram da sentença ao Tribunal de Justiça, ou seja, a segunda instância de julgamentos. A tese da defesa – pelo que ouvimos em rádio – é de que não houve enriquecimento ilícito da ex-prefeita e, portanto, não deveria ser condenada por improbidade. Já o Ministério Público também recorreu da sentença em primeira instância, pedindo agravamento da sentença, ou seja, que fosse mais severa devido aos danos provocados ao patrimônio público dos frutalenses.

O que pode acontecer?

Com o julgamento em segunda instância, tudo pode acontecer. E há três possíveis caminhos finais para entendermos o resultado de todo esse processo:

Caminho 1: os desembargadores mantém a sentença como está, não mudando nada. A condenação por improbidade enquadraria a ex-prefeita Ciça na chamada Lei da Ficha Limpa que prevê que, candidatos condenados por atos de improbidade e que tenham a decisão confirmada por decisão colegiada (uma turma de desembargadores), não pode ser candidato.

Caminho 2: os desembargadores acatam a tese da defesa, amenizam a pena e permitem que Ciça confirme sua candidatura, reformando a sentença em primeira instância.

Caminho 3: a tese da promotoria é acatada e a pena agravada, impedindo a candidatura ainda com base na Lei da Ficha Limpa.

Relembre abaixo as irregularidades que culminaram na anulação do concurso feito pela ex-prefeita Ciça e a consequente ação que agora ela responde em BH:

a. existe indício de quebra de sigilo das provas e de favorecimentos pessoais.

b. fiscais que aplicaram as provas ignoraram a exigência da apresentação de documento de identificação de candidatos.

c. nos editais, não houve a prescrição da consideração de títulos para atribuição de pontos na classificação final dos candidatos. Flagrante de ilegalidade.

d. na folha de respostas os candidatos tiveram que escrever seus nomes, o que pode ter comprometido o indispensável sigilo da prova, pondo sob suspeita a lisura da correção e da atribuição de notas, contaminando o certame. É usual nos concursos públicos para admissão de servidores públicos a utilização de procedimentos de desindentificação dos candidatos.

e. a UNICON efetuou grosseira “clonagem” de parte das questões, plagiando diversos enunciados e alternativas de provas anteriormente efetuadas em concursos públicos, cujas questões encontram-se à disposição na Internet. A existência de questões do concurso já publicadas e já respondidas na Internet denota a existência de exposição de parte da prova e desfigura o ineditismo do concurso.

f. houve comunicação entre candidatos durante a realização das provas. Candidatos deram e receberam auxílio para a execução das provas. Durante a realização das provas, houve o porte de aparelho celular por alguns candidatos; trânsito de candidatos pelos corredores e banheiros, sem fiscalização adequada.

g. o lacre que guarnecia as provas era frágil e inadequado;

h. haviam diversas provas em caráter de reserva, emaranhadas com provas de variados cargos dentro de envelopes sem o devido lacre. Haviam provas borradas por pingos de chuva.

i. equipe de aplicação das provas inexperiente e formada por sua maioria de servidores municipais. Suspeita do uso de mão de obra pública.

j. a conferência das respostas não foi feita pelo processo de leitura ótica. A mesma foi realizada de forma manual, gerando margem para erros. Um número interessante para medir a fragilidade da conferência: foram aferidas cerca de 137.880 alternativas assinaladas como corretas (3.447 candidatos x 40 questões cada prova), de forma pessoal em pouquíssimos dias;

k. muitos candidatos tiveram o início das provas do concurso retardadas porque seus nomes não constavam na relação de candidatos do local previamente estabelecido no ato da inscrição ou porque suas respectivas provas não foram localizadas no momento da distribuição das mesmas. Certamente estas pessoas ficaram nervosas e psicologicamente prejudicadas com o inesperado vexame;

l. candidatos tiveram recursos completamente ignorados;

m. candidatos auferiram notas maiores ou menores do que realmente deveriam receber.

n. a importância cobrada para a inscrição nos concursos não foi proporcional às despesas. A UNICON arrecadou mais de R$ 90.000,00 (NOVENTA MIL REAIS) nos concursos públicos realizados para a Prefeitura Municipal de Frutal e Câmara Municipal de Frutal. Cada candidato depositou a taxa da inscrição (que variou de R$ 20,00 a R$ 50,00), DIRETAMENTE NA CONTA CORRENTE DA UNICON E PORTANTO A ARRECADAÇÃO NÃO FOI CONSTITUÍDA RECEITA PÚBLICA.

o. a qualidade dos procedimentos e do material empregado nos concursos foi de baixa qualidade. Fichas de inscrições, por exemplo, foram xerocadas e havia erros grotescos de digitação na mesma. Os campos para informação do CPF continham apenas 10 espaços para os caracteres, sendo o correto onze espaços. A palavra CIDADE foi grafada “IDADE” e a palavra SEXO foi escrita “EXO”. A correção destes erros foi feita a caneta mesmo. As fichas de inscrições não continham numeração prévia e não apresentava nenhum dado sobre a UNICON.

rrochaok

luzia

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rdportari

Jornalista, professor universitário, Dr. em Comunicação

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